sexta-feira, 6 de outubro de 2017

A POESIA DE P.F.FILIPINI (PÂMELA FILIPINI)


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(Foto de Pâmela Filipini autografando seu livro em São Paulo)

p.f. filipini, que escreve no tuíter, chamou-me a atenção desde que comecei a escrever aqui, pelos seus poemas. Poemas intimistas, profundamente intimistas que, antes de tudo, descrevia o amor, o feminino, a solidão e também a angústia dos tempos amargos que vivemos. Entrei em contato com ela. E começamos a trocar e-mails. Ela tinha, então, 21 anos de idade. Jovem demais para escrever poemas com uma carga existencial marcante. Passou algum tempo ela teve a oportunidade de publicar seu primeiro livro "Folhas dos Ossos - ou o tratado das coisas insignificantes", pela Editora Patuá, de São Paulo, com prefácio assinado por mim, com o título "A poesia da solidão".
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Agora surgiu uma outra oportunidade. De vez em quando um editor de Coimbra, meu amigo, o poeta Xavier Zarco, pede-me que indique algum poeta brasileiro para participar da coleção "Mínima", que ele tem na sua editora, a Temas Originais. Sempre indico alguém, mas na verdade evito fazê-lo porque isso representa arrumar inimizades dos que se sentem preteridos. O que, aliás, é algo que não existe. Não descarto ninguém. Mas sempre dá problema. Desta vez, esse editor me pediu um livro e eu indiquei a Pâmela. Aceitou. A p.f.filipini então reuniu 40 poemas que tinha guardados e fez um livro que recebeu o título "Ensaio sobre a Geografia dos Cernes ou poemas para os átomos da minha solidão". O livro de Pâmela acaba de ser publicado em Coimbra, Portugal. Seus poemas estão sendo lidos na Universidade de Coimbra. A Coleção "Mínima" se destina exatamente aos universitários de muitos países que vão estudar em Portugal.
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É mais um feito para a poesia de Pâmela Filipini, que sabe bem lidar com as palavras, dentro do que se espera de alguém com sua idade. Pode parecer que não, mas isso conta sim. Uma bagagem existencial não se ganha do dia para a noite ou da noite para o dia. Não. Essa bagagem existencial se ganha com o tempo até ser transformada em poesia. Pâmela está no caminho correto. Extrai de si o que a poesia lhe reserva.
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Fiz questão de colocar este texto no meu blog, para enaltecer uma poeta que nasce consciente do que é a poesia, do que ela significa na vida das pessoas.
Deixo abaixo o prefácio que escrevi para o primeiro livro de Pâmela. Lançarei mais um livro em Portugal, "23 elegias da mão esquerda" no dia 21 de outubro, quando, então, terei os livros de Pâmela. E guardarei um tempo para falar sobre Pâmela numa palestra que farei na Casa da Escrita.

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A POESIA DA SOLIDÃO

                       Álvaro Alves de Faria 
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Meu ato de escrever poesia é uma tentativa de ser em mim e me enxergar no mundo. É assim que Pâmela Filipini, de apenas 21 anos, se situa diante desse quadro tantas vezes doído de escrever, de atravessar as palavras para se redescobrir sempre diante de uma paisagem destruída. Pâmela deixa claro: “A forma como enxergo o mundo é também a forma da minha palavra”. De uma pequena cidade do interior de Rondônia - esse Brasil desconhecido - essa poeta é uma afirmação da mais séria e honesta poesia que este país ainda produz. Este “Folhas dos Ossos ou o tratado das coisas insignificantes” é prova eficaz de que vale a pena acreditar, porque, seja como for, a poesia existe, está em todo lugar, basta ter olhos de observação, basta sentir, basta saber colher. Os poemas de Pâmela exprimem-se numa palavra com rumo certeiro, que é o sentimento humano. Exatamente o sentimento humano que parece estar proibido atualmente na poesia brasileira pelos que se julgam donos da palavra. Estes poemas são, também, a afirmação de uma profunda solidão que, na verdade, é a própria alma dessa poesia que atravessa a pele e se estende em tudo que pertence à vida. “Sou pobre de geografias/só me encontro no tropeço”, diz ela em um  poema, sinalizando sua literatura poética e até mesmo sua própria vida. Ela está nestes poemas. Vive nestes poemas. Os poemas são ela, sabendo que   amar é a vida praticando seus exercícios, como ela afirma. Por isso diz com razão em outro poema: “Ausentei-me do mundo para estar/presente em mim mesma”. Estamos diante de um livro de poemas, um belíssimo livro de poemas, escrito especialmente com essa dor de uma solidão feroz, que consome por dentro e por fora, consome as coisas, os objetos, a solidão que consome a própria solidão. Esse sentimento percorre todo o livro de Pâmela Filipini com poemas elaborados somente com a palavra da poeta e o que sente diante do mundo e do que a cerca. Pâmela diz que nasceu antiga e se sente assim antiga. Sua poesia é sua forma de fazer com que seu espírito não expire. Observa que sua linguagem no mundo é a poesia: “A poesia é um nascer constante e, portanto, um morrer constante, por isso ela dói e incomoda. A poesia é o estado natural das coisas miúdas e, muitas vezes, insignificantes. É uma entidade existencial tão humana quanto a própria humanidade”. Esse é seu retrato feito por ela mesma, explicando que ser poeta é um estado de solidão. Pâmela adianta em um poema que quer ser de si mesma a própria prece. E que há algo sagrado em ser sozinha: “É preciso se reinventar todos os dias como os pássaros que repetem os voos”. Pâmela assegura que as pessoas são só por essência e isso incluiu especialmente a poesia: “Ser poeta é ser um estado de solidão. O poeta não sabe como a alma das coisas e dos seres acontecem nele, mas sabe quando a poesia está presente”. Não pode haver explicação mais clara. Vejam: “Quem se arma com poesia/ luta somente as próprias/guerras”. É assim mesmo. Há de se destacar, também, a delicadeza destes poemas, destas palavras, a delicadeza da poesia de mulher, que só a mulher sabe cultivar e dizer, porque pertence a um universo desconhecido da maioria, mas que vive sempre, está em todo lugar. “A poesia é como uma vela que ilumina para dentro, um silêncio que silencia outros silêncios até que tudo se torne uma prece dirigida à miséria humana”. Por esse motivo, afirma que o poeta é o próprio espírito da solidão. Só a poesia, como a da Pâmela, pode alcançar estados de beleza assim: “Eu morro/morro com a tristeza/de um domingo à tarde”. Mais: “Se te pareço cansada/é porque/consegue/me enxergar/como sou”. Ou ainda: “As folhas caem nos quintais/para mostrar/que as árvores também/possuem seu próprio/jeito de chorar”. Fazia muito tempo que não surgia um livro de poesia assim, uma espécie de ferimento que não se fecha. Não se fecha mas está sempre aberto à vida. Esta poesia de Pâmela Filipini é uma narrativa de se sentir sempre, pelo que contem de beleza, desse ato poético que é seguir. Por isso, como ela diz, toda a canção de vida só pode ser cantada no coração.