segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

O HOMEM ANTIGO NÃO SABE COMO SEGUIR

O homem antigo está diante de si. Como se não estivesse. O homem antigo não compreende porque, ao olhar no espelho, ele vê a figura de uma mulher distante que habitou sua vida por alguns dias, mas que deixou marcas, uma cicatriz - ele sabe - que não desaparecerá nunca mais. O homem antigo tem um arrependimento dentro de si, mas não sabe do quê. O homem antigo nunca sabe de nada. O homem antigo quer apenas viver o que lhe resta, Anda entre as árvores, os pássaros e as palavras que machucam sempre. O homem antigo escreve um poema no meio da noite e adormece. O homem antigo sempre adormece. E sempre sonha sonhos impossíveis de realizar. O homem antigo nem sabe mais se deseja realizar seus sonhos. As pessoas pedem atitude, em vez de sonhos. Mas a esta altura da vida o homem antigo não quer mais mudar. O homem antigo costuma dizer aos pássaros que a poesia, hoje, é para poucos. Só para os que ainda têm alma. Ocorre que quase todas as almas estão brutalizadas pelo que é prático na vida. Não há lugar para o sentimento. O sentimento deixou de existir faz tempo e o homem antigo nem percebeu. O homem antigo viveu seu último amor e dá graças por isso. O homem antigo não compreendeu bem. Mas ele sabe que não é preciso compreender nada. As histórias se explicam por si mesmas. Com as próprias palavras.   

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

A ÚLTIMA CARTA DE AMOR





O homem antigo não sabe esquecer. Só sabe sentir. E guarda o que sente. O homem antigo se perdeu. Anda nas ruas perdidas de si mesmo. O homem antigo soube que o mundo vai se acabar. Lembra da mulher que ocupa sem pensamento e não sabe o que fazer. A mulher que ocupa seu pensamento preferiu a distância ao amor. O homem antigo soube que o mundo vai se acabar. Então começou a escrever sua ultima carta de amor. Mas não sabe a quem enviar, porque a mulher que ocupa todos seus momentos quer fugir da vida e deixar para trás tudo que sonhou. O homem antigo não compreende. Não sabe esquecer. No final das tardes vê as gaivotas no mar de Portugal e conversa com elas sobre coisas que ele mesmo não entende. O homem antigo se transformou num homem triste. Caminha com seu casaco pesado pelas ruas que esqueceu porque quer se perder ainda mais de si mesmo, para ficar sem nenhuma razão percorrendo as igrejas de seu silêncio. O homem antigo escreve sua última carta de amor, mas não sabe as palavras. Então permanece quieto dentro do quarto à procura das sombras para conversar. O homem antigo adormece e deixa que a vida exista em seu percurso, com suas dores e alegrias. Talvez seja melhor.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

O ÚLTIMO AMOR







O último amor é quando você não abre mais a janela.

O último amor é quando você sai às rua e vê que tudo mudou, os muros, as árvores, as pessoas que passam por você.

O último amor é quando alguém lhe diz que a Primavera já passou e você nem percebeu.

Quando as mãos trêmulas tentam acenar para alguém, mas não existe ninguém para o aceno.

O último amor é quando tudo se transforma numa lembrança vaga, sem nome, sem data, sem lugar.

O último amor é quando você deseja ficar em silêncio com você mesmo.

Quando você olha o mar e tem vontade de chorar.

Quando tudo parece ausente.

Quando você não sente suas mãos no bolso do casaco.

O último amor é quando você se olha no espelho e não se reconhece, transformado que está em um homem antigo.

O último amor é quando as palavras não bastam mais.

O último amo é quando a poesia deixa de existir.

O último amor é quando você vê na rua um amigo que já morreu.

O último amor é caminhar por lugares estranhos, que você não lembra.

É quando você sente que não vai dar mais tempo.