quarta-feira, 26 de abril de 2017

O HOMEM ANTIGO QUER ADORMECER DIANTE DO MAR.

(POR FAVOR, NÃO DEIXAR COMENTÁRIO)



O homem antigo disse aos pássaros da tarde que desistiu. Primeiro pensou em todas as coisas que ainda lembra e depois afirmou que desistiu. O homem antigo não compreende mais as coisas que o cercam. E também não quer compreender mais. A poesia sempre foi um ferimento que ele suportou a vida inteira. Está tudo muito distante e também ausente. O homem antigo observa a paisagem que lhe resta, o nada, e caminha invisível pelos poemas que deixou de escrever, sobre amores antigos, aqueles que deixaram de existir para sempre. O homem antigo não sabe mais de si mesmo. Está perdido dentro de si, andando devagar observando as últimas gaivotas de um tempo que desapareceu. O homem antigo quer somente olhar tudo de longe. O homem antigo deixou de existir como sempre foi. Agora fala sozinho sobre coisas que ele mesmo não compreende. O homem antigo quer adormecer diante do mar, mas não sabe se isso lhe será possível. O homem antigo cansou. O homem antigo caminha sozinho somente à noite, para não ser visto por ninguém. O homem antigo não sabe mais acreditar. O homem antigo permanece quieto envolvido na névoa de um tempo que apagou a vida. O homem antigo quer ir embora. Só ir embora, mais nada.  

quarta-feira, 5 de abril de 2017

AS PESSOAS CIRCUNSTANCIAIS


(POR FAVOR, NÃO DEIXAR COMENTÁRIO) 


As pessoas circunstanciais entram na vida da gente sem que se perceba. De repente, fazem parte de quase tudo. As pessoas circunstanciais surgem ninguém sabe de onde. Num Café, num restaurante, numa banca de jornais, numa livraria. A pessoa circunstancial se aproxima com alguma conversa qualquer. Tenho muitas pessoas circunstanciais na vida que me deixaram marcas. Angústias, decepções, dores. Às vezes nem me lembro mais, mas tento uma explicação. As pessoas circunstanciais desaparecem como surgem. A gente nem percebe. Percebe, sim, depois que somem deixando coisas quebradas, palavras duras, atitudes desprezíveis. Tenho medo das pessoas circunstanciais. Tenho receio de, de repente, encontrar uma delas. As pessoas circunstanciais passam sempre ao esquecimento total, pelo menos no que me diz respeito. As pessoas circunstanciais estão em toda parte. Parece que escondidas nos becos. Nas ruas sem saída. Para estar num beco e ruas sem saída basta eu mesmo, eu comigo mesmo. Eu devo ser uma pessoa circunstancial para minha própria vida. Por isso não me levo a sério. As pessoas circunstanciais não têm compromisso com nada. Eu,  particularmente, tenho um compromisso com a poesia, que é quase a mesma coisa. Pessoa circunstancial de mim mesmo, nada mais tenho a dizer.