"O Pássaro" é o título do poema com que participo de uma antologia de poetas de dezenas de países, "No Resignación", sobre a violência contra a mulher, coletânea organizada pelo poeta peruano-espanhol Alfredo Pérez Alencart, da Universidade de Salamanca, Espanha. São poetas do Brasil, Cuba, Panamá, Estados Unidos, Estônia, Iraque, Peru, Japão, Porto Rico, Itália, França, Chile, Espanha, Colômbia, Grécia, Índia, Inglaterra, Nicarágua, Kosovo, Turquia, Indonésia e muitos outros países. Neste blog há uma resenha sobre "No Resignación" postada recentemente.
OBS: Publico "O Pássaro" em sua versão original, em português.
O PÁSSARO
O pássaro de asas feridas,
ave cortada por dentro
por essa faca afiada do
algoz.
O pássaro não voa
e se deixa esquecer
quando devia viver
sua palavra mais aguda
na escuridão de seu silêncio.
Não devia esse pássaro
ferir-se mais diante
das janelas insanas
de longas asas
e unhas afiadas.
Não.
Não devia esse pássaro
Com seu ferimento
viver nesse cárcere
que cerca sua vida.
Não devia esse pássaro
interromper seu dia,
não devia esse pássaro,
não devia.
A palavra que desvenda
o que agride e machuca,
a costura na boca
com agulhas do ultraje.
Essa mulher,
esse pássaro,
esse passo,
esse poço.
Sonho, mulher, teu espaço,
tuas asas.
Sonho, mulher, teu aceno
na planície mais ampla
com teu gosto de amora
que nasce à mesa
e renasce
na árvore dona de si.
O espelho que se quebra
ao olhar do esquecimento:
que se quebrem todos,
mas que se salve tua face,
no que tens por sentimento.
As mãos tecelãs
tece a tez que te pertence,
a vida que te é devida,
ave ávida por viver,
assim mulher,
assim pássaro.
O lábio de vidro que se
parte,
um objeto,
um destino,
o choro que lava o rosto.
Não pode ser mais assim.
Apagada que está no céu,
a estrela foi feita para
brilhar,
o golpe brutal do verbo e do
gesto
não cabe no recinto da vida.
Álvaro Alves de Faria
Brasil
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir